Um hospital com um andar cheio de bebês está começando a ruir e quase indo ao chão. Alfred tenta ligar para três super-heróis e não consegue a resposta de ninguém. A solução foi acionar a quarta opção, Barry Allen, o Flash, que naquele momento estava impaciente na cafeteria esperando seu sanduíche ultracalórico.
Estas são as primeiras cenas de “The Flash”, filme dirigido por Andy Muschietti, Ezra Miller no papel principal, que estreia nesta quinta-feira (15).
Resignado, Barry sai correndo para tentar resgatar os recém-nascidos, uma enfermeira e um cão-guia que estão prestes a ir pelos ares. Ele é bem-sucedido na missão, mas ainda assim, é visível a sua frustração com os companheiros e seu papel na Liga da Justiça.
“Ele é profundamente humano. De todos os super-heróis, ele é, provavelmente, o cara com mais elementos de reconhecimento ou identificação com o público, porque ele é muito humano”, diz o diretor Andy Muschietti, que também esteve à frente de “It: A coisa.”
“Ele mesmo reclama sobre ser o faxineiro da Liga da Justiça, o que é um grande começo. Coloca Barry Allen em uma posição vulnerável. Acredito que isso seja importante para as pessoas relacionarem emocionalmente com o personagem a partir das suas próprias vulnerabilidades.”
Depois de salvar os bebês, Flash retorna à cafeteria e à rotina como Barry. Ele está novamente atrasado para seu trabalho como cientista forense e seu pai, Henry (Ron Livingston), vai enfrentar, no dia seguinte, mais uma audiência no tribunal que pode ou não o livrar da acusação de ter matado sua mulher e mãe de Barry, Nora (Maribel Verdú).
Triste com o desenrolar do destino, Barry começa a correr e correr e… correr. Ele corre tanto que descobre que pode voltar no tempo. E consertar aquilo que acha que está errado.
Ao conversar sobre a sua proeza com o amigo Bruce Wayne, nesta hora, Ben Affleck, ele é alertado sobre os perigos que isso pode trazer, o efeito borboleta e mais uma ou outra frase de efeito ou conselho, que obviamente vão ser ignorados.
Um multiverso para chamar de seu
Secretamente, Barry volta no tempo, salva a mãe, mas sem querer cria um novo universo, em que ele, Barry 1, neurótico e solitário, que lida com o trauma da perda, encontra com Barry 2, de 18 anos, que cresceu com a família unida e se tornou um cara mais relaxado, um adolescente irritante e que fica mais do empolgado com a possibilidade de se tornar um super-herói, sem nem questionar as consequências.
É um pouco difícil não lembrar (e procurar similaridades) de outros multiversos que surgiram nos últimos tempos, como o mais recente, na animação “Homem-Aranha: Através do Aranhaverso”, que estreou no início de junho. Até “Homem-Aranha: Sem volta para casa”, de 2021, vem à cabeça principalmente com as tiradinhas mais engraçadas de Tom Holland, comparáveis às de Miller.
Apesar destes multiversos todos serem e acontecerem de formas diferentes, dá ainda a impressão de que “já vi esse filme antes.”
Flash tem também seu caminho interessante e envolvente. O drama do cara neurótico, solitário e com um trauma de infância ainda latente e a vontade de fazer o que ele considera o certo dão a carga emocional fácil de se render e se relacionar. E até justificar a tentativa de Barry querer mudar o destino.
“A solidão é um tema neste filme e eu realmente queria me aprofundar nas suas neuroses e nas suas ansiedades da vida, e basicamente conectá-las ao incidente que criou esse personagem, que foi o assassinato da mãe. Este é o trauma que mudou sua vida para sempre”, diz Muschietti.
“É importante para a história que ele encontre uma versão de si mesmo que não tem isso, que todas as suas ansiedades foram removidas. As dificuldades foram removidas justamente porque sua mãe estava lá. Essa interação [entre os dois Barries] é importante.”
Ezra Miller faz muito bem a dobradinha Barry 1 x Barry 2. Miller foi um problema para a produção do filme nos bastidores ao se envolver em brigas, acusações de assédio e ter sido condenado por roubo, mas mostrou que seu talento é inegável ao entreter o público com momentos de humor e, em minutinhos depois, levar emoção aos momentos mais tensos e melancólicos.
Apego à nostalgia
Para que serve o multiverso senão para buscar as memórias afetivas de um passado distante? E Muschietti pegou pesado ao trazer Michael Keaton de volta à armadura aposentada de Batman.
O ator encarou o personagem em “Batman”, de Tim Burton, em 1989, e é possivelmente considerado o melhor dos Batmen. Ou um bem querido, que faz o público suspirar ao repetir a frase célebre “Quer ficar louco? Então vamos ficar loucos.”
Na trama aqui, Barry 1 e 2 querem encontrar Superman para ajudá-los. O melhor investigador que Barry 1 conhece é justamente Bruce Wayne, desta vez, Keaton, que no início se recusa dar uma mão na missão, mas não impede que eles mexam nas batcoisas, na batcaverna, com o batmóvel…
“Eu criei uma espécie de situação complexa. Eu não queria ter Bruce Wayne no mesmo lugar onde o deixamos 30 anos atrás”, diz Muschietti.
“Tem bastante incertezas, algumas questões sobre por que ele está neste lugar. Queria que Batman estivesse no fim de uma jornada, de uma minijornada, no centro do filme, onde Bruce Wayne começa como herói relutante e depois muda de ideia.”
Funciona para atrair a plateia, mas talvez não tenha caído tão bem para Flash, pelo menos em partes do filme. Com a entrada aguardada do veterano, o personagem de Miller pareceu um coadjuvante na própria história em um ou outro momento, a exemplo da sequência do resgate do herói sumido.
Isto, no entanto, não retira a diversão do filme nem a justificativa de ele existir. Muito pelo contrário, trazer este e outros elementos escondidos na trama dá ainda mais vontade de acompanhar a saga.
“Para mim, pessoalmente, foi como um sonho se tornando realidade: trazer alguém que eu nunca pensei que voltaria, que era este Batman”, diz Muschietti.
“E eu acho que para a maioria das pessoas da minha geração é empolgante vê-lo voltando. Nunca pensei que seria eu a pessoa que o traria de volta, mas aqui estamos.”
Além de Keaton, o filme deixa espalhados pelo filme outros easter eggs, não só do universo DC, como Nicolas Cage, como um Superman que nunca existiu, e outros rostos familiares da cultura pop.
“Foi muito divertido [trazê-los de volta]. Eu acho que nada é gratuito neste filme. As aparições de todos esses personagens amados de outras versões cinematográficas de super-heróis são muito bem inseridas nas histórias”, afirma Muschietti.
“Claro que tem um monte de outros personagens que eu gostaria de ter usado, mas decidimos por estes que significaram um pouquinho mais e que as pessoas se relacionam emocionalmente.”
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