Nova tendência da geração Z: Virar a noite na balada, movido a álcool, pode estar se tornando coisa de gente mais velha.
Quem diria? Para muitos millennials – como se convencionou chamar os nascidos entre 1980 e 1995 -, conseguir atravessar uma madrugada de bebedeira é sinônimo de noite bem-sucedida. Lidar com dilemas morais e físicos no dia seguinte é uma consequência natural.
Mas dados de 2023 do Relatório Covitel, pesquisa sobre hábitos de saúde dos brasileiros, mostram que a vida noturna começa a mudar na geração Z – a dos nascidos de 95 a 2010.
Segundo o levantamento, a parcela de jovens de 18 a 24 anos que bebem álcool três ou mais vezes por semana caiu gradativamente desde o período pré-pandemia, de 10,7% para 8,1% neste ano.
Em 2023, pela primeira vez, o grupo dos mais jovens não teve a maior porcentagem no consumo regular de álcool. Foi superado pelas pessoas de 45 a 54 anos (9,1%) e de 55 a 64 (8,7%).
Não é tendência só no Brasil. “Em uma pesquisa de 2022, 23% dos jovens consumidores com mais de 18 anos na Europa Ocidental disseram que nunca bebem e apenas 1% disse que bebe diariamente”, cita Mariana Santiloni, gerente de serviços para clientes da América Latina na WGSN, empresa que analisa comportamentos de consumo.
“Enquanto outras gerações podem beber álcool para desestressar, a geração Z está se tornando a mais sóbria. Está priorizando a saúde e o bem-estar nas bebidas, procurando por ingredientes e marcas ‘limpas’.”
Reparou que as opções de cerveja sem álcool se multiplicaram nas prateleiras dos supermercados? “É um dos segmentos que mais crescem hoje dentro do universo das cervejas”, diz Gustavo Castro, diretor de inovação da cervejaria Ambev.
A empresa tem investido pesado no lançamento e divulgação de bebidas sem álcool e reduzidas em calorias. Chegou a criar, em 2022, um produto que reúne essas características com uma infusão de vitamina D — hormônio desenvolvido no organismo através da exposição ao Sol.
“As pessoas estão buscando uma vida mais equilibrada. Os nutricionistas falam para, se for consumir chocolate, escolher um com 70% de cacau. A mesma coisa funciona para a cerveja”, explica Gustavo.
“Além disso, algumas barreiras sociais estão sendo quebradas: hoje há um aval importante para esse tipo de bebida, quando o consumo é feito em conjunto, entre amigos. Isso não acontecia antes.”
Noites bem dormidas
O que poderia ser considerado careta no passado é o novo “cool”. No Reino Unido, as chamadas festas “before midnight”, que terminam antes da meia-noite, têm atraído adultos com compromissos pela manhã, mas também jovens amantes de noites bem dormidas.
“O autocuidado é tema central dessa mudança”, diz Junior Passini, empresário conhecido da noite paulistana, sócio do Bar Alto, que tem na agenda fixa sua própria festa Antes da Meia Noite.
Começando no fim das tardes de domingo, o evento tem DJs tocando hits do pop, como qualquer balada comum, mas também oferece comidas elaboradas, lugares para sentar e, ás 23h, frequentadores já podem estar em casa de pijama e pantufas, tomando um chá quente.
Ele enumera hábitos que se tornaram comuns na vida noturna da geração Z: “Tomar cuidado na noite anterior, para que o dia seguinte não seja prejudicado pela bebedeira, voltar mais cedo ou até preferir não ir a uma festa por algum compromisso com o bem-estar: a academia, por exemplo.”
Um ambiente com bebida, música e estímulo à pegação já não é o suficiente para tirar os novinhos de casa. Mariana, da WGSN, diz que eles estão buscando “cultura, estética e experiências, em vez da devassidão”.
Ter espaços “instagramáveis” virou regra para negócios da noite, festas passaram a usar recursos sensoriais e instalações artísticas para atrair público e alguns bares transformaram drinks em verdadeiros monumentos para fotografar.
‘Cansaço rave’
A pandemia foi crucial para a mudança de ritmo na noite. Especialistas estão chamando de “cansaço rave” o sentimento de exaustão que muitos sentem ao tentar retomar os velhos hábitos de lazer.
Depois de dois anos no sofá de casa, passar a noite em pé interagindo com semiconhecidos pode não parecer mais tão relaxante e divertido.
“A pandemia de Covid acelerou o interesse em manter uma boa saúde e aumentar a imunidade; reduzir ou eliminar o álcool fazia parte disso, assim como beber em casa em 2020”, lembra a analista de tendências da WGSN.
“Esperava-se que os jovens voltassem às casas de festas depois do isolamento, mas muitos ficaram em casa em 2022 por causa do aumento dos custos, dos novos hábitos de bebida e de um desinteresse geral pela vida noturna”, ela continua.
“O cansaço rave dos jovens está passando, mas eles estão interessados em um tipo de cultura noturna e em festas diferentes das gerações anteriores.”