Os telhados triangulares, a grama sempre verde e as árvores com copas cheias do bairro do Limoeiro, conhecido por ser a casa da Turma da Mônica, podem parecer restritos à imaginação. No entanto, segundo Mauricio de Sousa, o criador da famosa turma, esse cenário foi inspirado em um bairro real de Campinas (SP): o Cambuí.
Por que o Cambuí?
A escolha do bairro como cenário das aventuras de Mônica, Magali, Cascão e Cebolinha não foi aleatória. Na década de 70, Mauricio de Sousa morava com sua família em Campinas, no próprio Cambuí, e decidiu usar o local como inspiração.
“Campinas era então mais tranquila e os prédios ficavam mais para o horizonte. O que gostei foi ver que havia muitas árvores frutíferas e arbustos nas ruas, logo imaginei que gostaria de ver meus personagens brincando naquelas ruas tranquilas e seguras”, lembra Mauricio.
Em um período de expansão urbana, os prédios que antes se viam ao longe logo se tornaram parte do cenário metropolitano. No entanto, para o cartunista, a ideia de um bairro arborizado e tranquilo para crianças permanece “congelada” nas histórias em quadrinhos até hoje.
“Dos anos 70 em diante, as pessoas preferiam andar pelas ruas a pegar seus carros para ir a lugares próximos. Procuro manter esse cenário em minhas histórias até hoje para mostrar às crianças que viver feliz não é só se fechar em casa jogando videogames. A vida é muito mais. Veja que nossos personagens também não ficam colados em celulares. Preferem conversar e brincar ao vivo e em cores.” — Mauricio de Sousa, cartunista, empresário e criador da Turma da Mônica.
Diferente, mas ainda igual
Apesar das transformações, uma caminhada pela região do Cambuí em 2024 revela que o bairro ainda mantém muitos dos seus elementos históricos. A Praça Carlos Gomes, por exemplo, parece ter resistido ao tempo, com o coreto mantendo-se intocado.
As casas também contam sua própria história. Um exemplo é um antigo casarão na esquina das ruas Antônio Cesarino e Ferreira Penteado, que hoje abriga uma galeria com lojas, espaços de atendimento, restaurante e até um estúdio de tatuagem.
No entanto, nem todas as estruturas mantiveram sua antiga glória. Um casarão na esquina das ruas Antônio Cesarino e General Osório, com mais de 50 anos, agora exibe pichações e tapumes.
Enquanto isso, na Rua Padre Vieira, novos prédios contrastam com a vegetação remanescente, denotando a passagem do tempo e o desenvolvimento do bairro.
Mobilização Popular
As mudanças no Cambuí foram acompanhadas de perto por Tereza Penteado, gestora ambiental e moradora do bairro há mais de 60 anos. Ela fundou uma ONG dedicada à preservação do Cambuí após concluir um curso de patrimônio histórico e arquitetônico em 2003.
“Numa das conversas com o pessoal da classe, eles falaram ‘nossa, o que a gente pode fazer pelo Cambuí?’. Nós decidimos criar uma ONG para cuidar das árvores, do meio ambiente, e aí começou a ideia. […] A certa altura do campeonato, a gente conseguiu plantar quase 400 árvores no bairro”, conta Tereza.
Para Tereza, os maiores desafios enfrentados pelo bairro são a falta de arborização e de áreas que permitam a drenagem da água, evitando alagamentos. O engenheiro florestal e agrônomo José Hamilton de Aguirre Junior, que também faz parte da ONG, reforça esses pontos.
“É uma área de grande circulação de pessoas e carros, então é uma área extremamente poluída, que precisa também de muita arborização. Outro grande desafio é a drenagem do local, porque perdeu todas as áreas permeáveis, de jardim e quintal. Os prédios precisam ter também muita área permeável, com jardim, com áreas novas para colaborar com essa dinâmica de chuva”, afirma Aguirre.
A organização faz um levantamento completo das árvores do Cambuí a cada cinco anos para entender a dinâmica do bairro e seus efeitos climáticos.