Com as intensas dores e desconfortos que muitas mulheres enfrentam durante o período menstrual, algumas empresas brasileiras têm adotado, de forma voluntária, a licença menstrual como um benefício para suas funcionárias. A medida visa oferecer um acolhimento em momentos em que a produtividade pode ser afetada, além de reconhecer os impactos dos sintomas menstruais no bem-estar das colaboradoras.
A Digix, empresa de soluções em software de Mato Grosso do Sul, foi pioneira na implementação da licença menstrual, adotando o benefício em março de 2023. Desde então, a companhia tem registrado um alto índice de adesão, com mais de 1,3 mil licenças concedidas até setembro de 2024. O processo é simples: a funcionária comunica seu gestor e o afastamento é registrado na folha de ponto, sem necessidade de atestado médico.
“Implementamos a licença menstrual para transformar a relação entre saúde e trabalho, reconhecendo os impactos dos sintomas menstruais na produtividade e bem-estar”, declarou Suely Almoas, presidente da Digix. A empresa, que possui 811 colaboradores, sendo 530 mulheres, busca inspirar outras organizações a adotarem práticas semelhantes.
Seguindo a mesma linha, o Grupo MOL, que tem 83% de sua equipe composta por mulheres, também implementou a licença menstrual em março de 2023. Segundo a cofundadora da empresa, Roberta Faria, a licença não afetou significativamente a produtividade. “Mais de 73% das licenças são de meio período, permitindo que as funcionárias consigam descansar sem prejudicar o andamento das tarefas”, explicou Roberta.
Além de promover o bem-estar das funcionárias, a adoção da licença menstrual também envolve um aspecto importante: garantir que o salário das colaboradoras não seja prejudicado. De acordo com a advogada trabalhista Marina Camargo Aranha, o benefício não pode resultar em desconto salarial. “Alterações no contrato de trabalho, como a licença menstrual, devem ser acordadas com o consentimento de ambas as partes, e o benefício, uma vez implementado, não pode ser retirado”, afirmou a especialista.
Licença Menstrual: Proposta de Lei no Brasil e no Mundo
No Brasil, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não prevê uma licença específica para o ciclo menstrual. Atualmente, a licença médica comum pode ser usada para justificar a ausência de uma funcionária devido à menstruação, mas ela exige atestado médico e é limitada a casos de doenças graves associadas ao ciclo.
No entanto, um projeto de lei federal em andamento propõe que mulheres que apresentem sintomas graves durante a menstruação possam ter direito a até três dias consecutivos de licença remunerada por mês. Em alguns estados, como o Distrito Federal, a licença menstrual já foi aprovada para servidoras públicas, apesar de enfrentarem desafios em sua regulamentação.
A Espanha foi pioneira ao tornar a licença menstrual um direito legal em 2023, e outros países como Japão, Coreia do Sul e Taiwan também já implementam esse benefício. A implementação de políticas semelhantes no Brasil poderia representar um grande avanço para a saúde das mulheres trabalhadoras.
A Importância do Diagnóstico e Acompanhamento Médico
A médica Lia Cruz Damásio, da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), destaca que algumas mulheres enfrentam dores incapacitantes durante a menstruação, que podem prejudicar suas atividades diárias. “É importante que essas mulheres tenham um acolhimento adequado, com diagnóstico médico e tratamento apropriado”, afirma a ginecologista. Ela também ressalta a importância de regulamentações adequadas para garantir que a licença menstrual seja utilizada de forma responsável, para que não haja abusos ou banalizações do benefício.
A discussão sobre a licença menstrual também inclui pessoas trans, intersexuais e não binárias que menstruam, para garantir que todos os indivíduos afetados possam ter acesso ao benefício. O debate segue em evolução, e muitas empresas no Brasil estão mostrando que é possível promover a saúde e o bem-estar das mulheres sem que isso prejudique a produtividade no trabalho.
Com as iniciativas das empresas pioneiras e o avanço das discussões legais, a licença menstrual pode se tornar uma prática cada vez mais comum no Brasil, refletindo uma sociedade mais inclusiva e consciente das necessidades de saúde de suas trabalhadoras.